22-09-2009 - 11:45 - ANAPE interpõe Reclamação Disciplinar no CNJ contra Desembargador que desrespeita Carreira no Paraná
Já protocolizada:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA - CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES DO ESTADO – ANAPE, (qualificação), por intermédio de seu Presidente ao final assinado, vem respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fulcro nos artigos 67 e seguintes do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, apresentar
RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR
em face de conduta do Desembargador Abraham Lincoln Calixto, membro integrante do Poder Judiciário do Estado do Paraná, no exercício de jurisdição em segundo grau no Tribunal de Justiça do aludido Estado da federação, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:
DOS FATOS
A reclamação disciplinar tem por objeto conduta reiterada praticada pelo Des. Abraham Lincoln Calixto em ofensa à moral, à honra e ao direito de Procuradores do Estado do Paraná ao regular e legítimo exercício das atribuições de seu cargo.
Há algum tempo os Procuradores do Estado do Paraná tem verificado que o reclamado passou a adotar postura agressiva em relação a aspectos e situações que deveriam ser tratadas com a objetividade que o cargo de Magistrado demanda para a justa prestação jurisdicional.
Rotineiramente o reclamado profere manifestações de ordem subjetiva direcionadas a denegrir ou desmerecer o trabalho dos Procuradores do Estado, seja pela via escrita, seja pela via oral nas sessões de julgamento do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
Pode-se afirmar que praticamente não há sessão em que o reclamado deixe de tecer alguma consideração, sempre de ordem ofensiva, à atuação processual dos advogados do Estado.
Algumas situações concretas podem ser citadas e demonstradas:
1. Manifestação exarada no processo registrado sob o nº 481.208-2
Neste feito o reclamado ao decidir processo pelo qual o autor objetiva receber indenização do Estado do Paraná, assim se manifestou acerca do trabalho do Procurador responsável pela causa:
A duas, porque percebe-se facilmente, a considerar o teor dos argumentos constantes na peça recursal, que o Procurador do Estado, Dr. Manoel José Lacerda Carneiro, não detém o mínimo conhecimento jurídico sobre a questão do dano moral propriamente dito.
É primário que o dano moral configura uma ofensa ao patrimônio moral da pessoa, passando-se no seu íntimo psíquico, portanto tem-se que sua ocorrência independe de prova, decorrendo, na hipótese em exame, do próprio fato ilícito...
... Ora, o abalo psicológico, a dor suportada por esta mãe, é de impossível mensuração, ouso pensar que somente aferível por pessoa que tenha perdido um ente querido em circunstâncias similares à este brutal homicídio, de modo que a insensibilidade do Procurador do Estado subscritor da peça recursal, Dr. Manoel José Lacerda Carneiro...
Procurei palavras para de alguma forma, como se isso fosse possível, alentar a alma dessa mãe já tão atormentada com a prematura e violenta morte de seu filho, ofendida agora com a posição do Procurador do Estado em presumir que um filho possa ser um fardo na vida dos pais... (cópia da manifestação anexa)
2. Manifestação exarada no processo registrado sob o nº 440.462-0
Neste processo, o Procurador do Estado interpôs recurso de agravo de instrumento, no regular exercício da função, e obteve do reclamado a seguinte decisão:
Diante do evidente intuito do recorrente em procrastinar a solução do processo principal, através da interposição de recurso absolutamente injustificado e com o nítido objetivo de prejudicar a parte contrária, é, via de conseqüência o próprio Poder Judiciário, contribuindo para abarrotar este Poder com medidas despropositadas que poderiam facilmente ser evitadas, entendo por bem aplicar ao agravante as sanções pela litigância de má-fé...
Por fim, determino a extração de cópia integral do feito, encaminhando-se via ofício ao douto Procurador Geral do Estado para as providências administrativas que entender cabíveis.
3. Manifestação exarada no processo registrado sob o nº 174.696-5/01
Ao decidir embargos de declaração, o reclamado assim se posicionou em relação à conduta do Procurador do Estado responsável pelo feito:
Ora, para bom entendedor, resta claro que a sentença singular, nesta parte, foi modificada, tão somente, quanto ao valor dos honorários advocatícios arbitrados, mantida no mais a decisão monocrática. Denota-se que o recurso é meramente protelatório. Não há justificativa plausível para a sua interposição, senão a absoluta ausência de cuidado e leitura do processo por parte do recorrente, o que demonstra, no mínimo, a sua desídia em prejuízo da parte ex adversa.
...voto pela rejeição dos embargos opostos, com imposição de multa e remessa das cópias referidas no corpo deste decisum ao Procurador Geral do Estado, nos termos do voto e sua fundamentação.
4. Manifestação exarada no agravo registrado sob o nº 484.889-9
O Procurador do Estado neste recurso, juntou cópia integral dos autos originais, e ressaltou que não foi juntada cópia do instrumento do mandato outorgado ao advogado da parte agravada porque ele não constava do processo original. O Procurador, neste feito, inclusive fez referência à posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que na inexistência desta peça no processo original, o agravante apenas deve comprovar o fato mediante documento com fé pública, o que foi feito. Inobstante, o reclamado assim se dirigiu no despacho proferido:
Diante da desídia do Procurador do Estado Dr. Celso Silvestre Grycajuk, ao instruir o presente recurso, ocasionando manifesto prejuízo ao ente público, extraia-se cópia desta decisão e oficie-se ao Procurador Geral do Estado, a fim de que, entendendo cabível, adote as providências legais e administrativas.
Além das manifestações acima referidas, que puderam ser reproduzidas e juntadas neste pedido, inúmeras outras foram feitas, oralmente em sessões de julgamento, nas quais os adjetivos “desídia”, “ignorância”, “falta de zelo”, e “má fé” foram prodigamente utilizados.
O reclamado também, além de manifestações ofensivas produzidas nos processos em que atuou, fez publicar posição pessoal direcionada a opinar sobre a responsabilidade do Estado pelo pagamento de custas processuais em processos nos quais foi deferida a assistência judiciária gratuita, em defesa dos interesses privados dos titulares dos cartórios judiciais, e antecipando o seu julgamento acerca de inúmeros casos concretos que chegarão a seu exame jurisdicional (cópia anexa).
A conduta do reclamado não toma em consideração o dever funcional dos Procuradores do Estado e as atribuições inerentes e legítimas que constituem o exercício da advocacia,
DO DIREITO VIOLADO
O Procurador do Estado exerce uma das funções essenciais à justiça consoante preconizado no artigo 131 da Constituição Federal. Essa função essencial consiste na defesa dos interesses do Estado do Paraná, em juízo e fora dele. Tal atribuição, além de albergada pela Constituição, é respaldada e fundamentada pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.
A Lei nº 8906/94 prevê, para que se possa legitimamente exercer a advocacia, determinados direitos e prerrogativas aos advogados:
Art. 6º Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.
Parágrafo único. As autoridades, os servidores públicos e os serventuários da justiça devem dispensar ao advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho.
Na esteira da regra constitucional que prevê a indispensabilidade da advocacia para a administração da Justiça, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional estabelece deveres claros para os Magistrados, objetivando assegurar a legítima atuação do advogado, sem constrangimento ou receio de represália:
Art. 35 - São deveres do magistrado:
IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.
Art. 36 - É vedado ao magistrado:
III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.
O Código de Ética da Magistratura editado pelo Conselho Nacional de Justiça igualmente impõe ao Magistrado determinados deveres e vedações, com o fito de assegurar a objetividade da prestação jurisdicional e vedar manifestações de ordem subjetiva, mormente aquelas de cunho ofensivo à honra e ao direito de advogado ou das partes:
Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro.
Art. 2º Ao magistrado impõe-se primar pelo respeito à Constituição da República e às leis do País, buscando o fortalecimento das instituições e a plena realização dos valores democráticos.
Art. 3º A atividade judicial deve desenvolver-se de modo a garantir e fomentar a dignidade da pessoa humana, objetivando assegurar e promover a solidariedade e a justiça na relação entre as pessoas.
Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.
Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.
Parágrafo único.Impõe-se ao magistrado a utilização de linguagem escorreita, polida, respeitosa e compreensível.
Art. 25.Especialmente ao proferir decisões, incumbe ao magistrado atuar de forma cautelosa, atento às conseqüências que pode provocar.
A análise das normas acima invocadas, torna claro que o reclamado, ao proceder da forma igualmente demonstrada, violou direito dos Procuradores do Estado do Paraná, e violou as normas que estabelecem deveres e vedações para o Magistrado no exercício da função.
Olvidou o Magistrado que a advocacia pública se exerce, evidentemente nos limites da lei e da ética, defendendo uma tese jurídica, que, conquanto possa não ser simpática ao Magistrado – em caráter subjetivo -, constitui direito inalienável legalmente previsto.
O Procurador do Estado ao defender uma tese jurídica, ou a interpor recurso está a dar cumprimento ao contido no artigo 2º do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil:
Art. 2º O advogado é indispensável à administração da justiça.
§ 1º No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social.
§ 2º No processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público.
§ 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta Lei.
O objetivo inafastável da função do Procurador do Estado é o de postular decisão favorável ao seu constituinte, o Estado do Paraná. Como qualquer cliente, o Estado tem direito a ampla defesa e ao contraditório, nos termos da Constituição Federal. Ora, tais garantias constitucionais são efetivadas pela atuação dos Procuradores do Estado.
A conduta do reclamado ignora as prerrogativas e direitos dos advogados de sustentar teses jurídicas plausíveis e verossímeis, ou de recorrer de decisões objetivando decisão favorável ao seu cliente, reputando tais condutas como “falta de conhecimento”, “ignorância”, “litigância de má fé” ou “desídia”.
Como se pode observar dos documentos juntados e das alegações acima feitas, em nenhum dos casos em que houve desrespeito à atuação dos Procuradores do Estado se pode afirmar inequivocamente acerca de desídia ou de má fé.
Reputar de forma reiterada e rotineira que um Procurador do Estado é ignorante ou desidioso constitui violação grave aos deveres de imparcialidade do Magistrado legalmente estipulados. Além disso, pode produzir constrangimento ilegal, causando obstáculos de ordem psicológica ao exercício pleno da advocacia: o receio de ser reputado “ignorante”, “desidioso” ou “litigante de má fé”.
Nem se argumente que o Magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar, vez que a hipótese é exatamente de excesso e de impropriedade da linguagem, que constituem exceção à regra da liberdade de expressão contida no artigo 41 da Lei Complementar nº 35/79.
O reclamado com sua conduta provada, demonstra preconceito e predisposição em relação à atuação dos Procuradores do Estado, além de ofender a honra e o direito destes profissionais, atentando em conseqüência, contra a legítima atuação do advogado e contra as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório previstas em favor também das pessoas jurídicas de direito público.
Em que pese a conduta em tela não se subsumir a nenhuma das hipóteses expressas do artigo 135 do Código de Processo Civil, é inegável que a conduta tendenciosa, eivada de predisposição e preconceito em relação aos Procuradores do Estado, macula de suspeição a atuação do reclamado em processos nos quais é parte o Estado do Paraná e caracteriza infração disciplinar em face do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e do Código de Ética da Magistratura.
DO PEDIDO
Pelo exposto, nos termos do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, requer:
Tendo em vista que os fatos relatados constituem infração disciplinar, e que estão devidamente provados documentalmente, seja recebida e processada a reclamação;
Presentes os requisitos normativos de admissibilidade da reclamação, seja o reclamado, Desembargador Abraham Lincoln Calixto, membro integrante do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, notificado para prestar as informações que reputar necessárias;
A instauração do devido processo administrativo disciplinar, para a apuração da responsabilidade do reclamado e aplicação de sanção pelas infrações disciplinares cometidas.
Seja incluída dentre as sanções, a declaração da suspeição do reclamado para atuar e prolatar decisões em processos judiciais ou administrativos em que o Estado do Paraná for parte, conferindo-se interpretação extensiva às regras contidas nos artigos 135 e seguintes do Código de Processo Civil, para alcançar e incluir como fundamento da suspeição a conduta do Magistrado, objeto da reclamação.
Termos em que,
Pede deferimento.
Brasília, 02 de setembro de 2009.
Ronald Christian Alves Bicca
Presidente da ANAPE - Associação Nacional dos Procuradores de Estado
Nenhum comentário:
Postar um comentário